esta é, assim, uma rua perfeitamente normal sendo anómala, um território sem fim onde, numa casa, me pus a pensar por cima dela;
penso
quando a noite cai,
e eu saio com a noite,
o que me faz passear surpreendendo-me com o facto nu de que o tempo intermitentemente se apaga, e o espaço cresce em mobilidade visível;
no meu passeio,
o espaço vai apagando o tempo, sua sombra vizinha, torna-se redondo ou contemplativo de si próprio, enquanto o percorro sem movimento, numa espécie de não ser, de não fazer; o não andar se instala, só há a mancha da noite como antes houvera a mancha do mundo, a nebulosa onde vou dar de comer aos gatos; desce sobre nós um enunciado positivo e real ______ a rua anómala, por me ver passar, derrama-se sobre mim, trocamos de inconsciência,
o texto a conhece, eu a desconheço, ambos a queremos; trocamos nossas formas que se dissolvem agora numa substância que sonhámos em permanência,
substância da dor de amor, outro nome do drama-poesia
porque o amor tem lados e tem dor, sombras vizinhas que convergem e divergem, uma dor que não nos socorre, e se afasta de nós;
andando, por carta ou por livro, dirijo-me directamente ao amor, interrogando-o
se a dor não é o preço desta rua,
destes olhos criados por uma certa densidade de luz,
às seis da tarde, quando saio
Maria Gabriela Llansol, Onde Vais, Drama-Poesia?, Relógio d'água editores, p. 302.
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